Introdução

O mundo do mercado financeiro está repleto de desafios e oportunidades. Porém, para realmente se destacar e ser bem-sucedido como trader, não basta apenas dominar técnicas e estratégias. O aspecto mental é tão crucial quanto qualquer ferramenta técnica que você possa utilizar. Mark Douglas, em seu renomado livro “Trading in The Zone”, aborda justamente a importância da mentalidade correta ao operar no mercado. E neste artigo, vamos mergulhar no capítulo 2 deste incrível audiobook, agora disponível em português.


Trading in The Zone – Capítulo 2

O fascínio (e os perigos) do trading

Em janeiro de 1994 pediram-me para falar numa conferência em Chicago sobre trading. Num dos almoços fiquei por acaso sentado ao lado de um editor de uma das maiores editoras de livros sobre trading. Estávamos a ter uma conversa animada sobre as razões por que tão poucas pessoas tinham sucesso em trading, mesmo sendo muito competentes noutras áreas. Num determinado momento, o editor perguntou-me se uma possível explicação para esse fenómeno podia ser por as pessoas se envolverem no trading pelas razões erradas.

O fascínio

Eu tive de fazer uma pausa para pensar sobre o assunto. Concordo que muitas das razões que motivam as pessoas a entrar no trading – a ação, a euforia, o desejo de sucesso, uma certa vaidade nos ganhos ou a autocomiseração nas perdas – criam constrangimentos que irão, em última análise, prejudicar o desempenho de um trader e o seu sucesso global. Mas a verdadeira atração subjacente ao trading é muito mais elementar e universal. O trading é uma atividade que oferece às pessoas uma liberdade criativa ilimitada, uma liberdade que é negada à maior parte de nós durante a maior parte das nossas vidas.

É claro que o editor me perguntou o que é que eu queria dizer com isto. Eu expliquei que num ambiente de trading, somos nós que definimos quase todas as regras. Isto significa que há muito poucas restrições ou limites quanto ao modo que escolhemos para agirmos. Uma vez iniciada a atividade de trading, as possibilidades são praticamente ilimitadas.

A liberdade é algo formidável. Todos nós ambicionamos, lutamos e até imploramos por liberdade de forma inata. Mas isso não significa termos os recursos psicológicos adequados para operarmos num ambiente como o do trading, onde existe a possibilidade de causarmos enormes danos a nós próprios. Quase todas as pessoas precisam de fazer alguns ajustes mentais, independentemente do grau académico, inteligência ou do sucesso que tenham tido noutras atividades.

O tipo de ajustes de que estou a falar tem a ver com a criação de uma estrutura mental interna que proporcione ao trader o maior grau de equilíbrio possível entre a liberdade de ação e a possibilidade real de sofrer danos financeiros e psicológicos em resultado direto dessa liberdade. Criar uma estrutura mental pode ser extremamente difícil, especialmente se aquilo que queremos implantar na nossa mente entra em conflito com aquilo em que já acreditamos. Quem quer ser trader, tem de estar preparado para enfrentar a dificuldade de criar uma estrutura adequada que conta invariavelmente com a resistência mental das convicções que se começam a desenvolver nas primeiras fases das nossas vidas.

Todos nós nascemos envolvidos num determinado ambiente social. Um meio social (ou ambiente), seja uma família, uma cidade, uma região, um país, sugere a existência de uma estrutura. As estruturas sociais são constituídas por regras, por restrições, por limites e por um conjunto de convicções que se tornam um código de comportamento que limita a forma como as pessoas dentro dessa estrutura social podem ou não expressar-se. Além disso, a maior parte das limitações da estrutura social foram estabelecidas antes mesmo de termos nascido. Por outras palavras, quando aqui chegámos, a maior parte da estrutura social que governa o nosso comportamento individual já estava consolidada e bem arraigada.

Não é difícil perceber por que a necessidade de uma estrutura numa sociedade e a necessidade dos indivíduos expressarem a sua própria individualidade podem entrar em conflito. Todas as pessoas que pretendem dominar a arte de trading enfrentam exatamente o mesmo tipo de conflito elementar.

Pense numa característica que seja comum a todas as crianças, independentemente do local, da cultura ou da situação social em que nasceram. A resposta é: curiosidade. Todas as crianças são curiosas. Todas as crianças anseiam por aprender. Poderiam ser descritas como pequenas máquinas de aprendizagem.

Consideremos a natureza da curiosidade. No seu nível mais elementar, é uma força. Mais especificamente, é uma força gerada internamente, o que significa que não há qualquer necessidade de motivar uma criança a aprender o que quer que seja. Entregues a si mesmas, as crianças vão naturalmente explorar o que as rodeia. Esta força inata gerada internamente parece ter a sua própria agenda; por outras palavras, muito embora todas as crianças sejam curiosas, nem todas as crianças são naturalmente curiosas sobre as mesmas coisas.

Há alguma coisa dentro de nós que dirige a nossa atenção para certos objetos ou tipos de experiências, em detrimento de outros. Mesmo os bebés parecem saber o que querem e o que não querem. Quando os adultos se deparam com uma expressão de personalidade de um bebé, ficam normalmente surpreendidos. Partem do princípio que os bebés não têm nada dentro deles que faça deles quem são. De que outro modo poderiam os bebés exprimir a sua individualidade a não ser pelo que lhes atrai ou repele? Chamo a esta orientação a força das nossas tendências naturais.

As tendências naturais são tudo aquilo pelo que sentimos um interesse natural ou entusiástico. O nosso mundo é grande e diversificado e oferece a cada um de nós muito para aprender e experimentar. Mas isto não significa que cada um de nós tenha um interesse natural ou entusiástico para aprender ou experimentar tudo o que existe. Há algum mecanismo interno que nos torna naturalmente seletivos. Se refletir um pouco, certamente conseguirá elaborar uma lista de tudo aquilo que pode fazer ou ser, mas pelas quais não tem o mínimo interesse. Da mesma forma, poderá fazer uma outra lista das coisas porque só tem um interesse mínimo. Finalmente, conseguirá elaborar a lista de tudo aquilo porque tem um interesse entusiástico. É claro que as listas vão sendo mais reduzidas à medida que os níveis de interesse aumentam.

De onde vem o interesse entusiástico? Na minha opinião pessoal é que vem do nível mais profundo do nosso ser – do nível da nossa verdadeira identidade. Vem da parte de nós que existe para além das características e dos traços de personalidade que adquirimos em resultado da nossa educação e formação social.

Os perigos

É ao nível mais profundo do nosso ser que existe o potencial para o conflito. A estrutura social em que nascemos pode ser ou não sensível a estas necessidades e interesses gerados internamente. Por exemplo, alguém que tenha nascido no seio de uma família de atletas de alta competição, pode sentir um interesse entusiástico por música clássica ou arte. Pode até ter capacidades atléticas naturais, mas não ter o mínimo interesse em participar em eventos desportivos. Existe aqui algum conflito potencial?

Normalmente, a maioria dos membros de uma família de atletas pressiona os mais novos para seguirem as pisadas dos irmãos, irmãs ou pais. Fazem todo o possível para ensinar os seus métodos e como aproveitar ao máximo as suas capacidades atléticas. Desencorajam outros interesses. Ao ceder a esta pressão exterior, não se sentem excluídos do seu ambiente familiar mas, ao mesmo tempo, esta parece ser uma decisão pouco certa, embora tudo o que aprenderam e lhes ensinaram indique que se devam tornar atletas. O problema é que o atletismo não tem nada a ver com eles.

Os conflitos que resultam daquilo que nos dizem sobre o que devemos ser e o sentimento que se repercute nos níveis mais profundos do nosso ser não são de modo algum negligenciáveis. Eu diria que muitas pessoas, se não a maioria, crescem num ambiente familiar e cultural em que objetivamente sentem pouco apoio para se expressarem através das formas para as quais se sentem naturalmente compelidos.

Não se trata apenas de falta de estímulo. Esta falta de apoio pode ser tão profunda como a negação total de alguma forma particular de expressão. Por exemplo, olhemos para uma situação comum: um bebé, que pela primeira vez na sua vida repara nesta coisa em cima da mesa a que chamamos jarra. Ele está curioso, o que significa que há uma força interior que o empurra para experimentar esse objeto. Num certo sentido, é como se esta força criasse um vácuo na sua mente que tem de ser preenchido com o objeto do seu interesse.

Assim, concentra-se na jarra e, com uma intenção deliberada, gatinha pelo vasto chão da sala em direção à mesa. Quando chega ao seu destino, levanta a mão para se apoiar, põe-se de pé e agarrando-se firmemente à mesa, esforça-se por manter o equilíbrio. Estende então a outra mão para tocar nesta coisa que nunca experimentou. Precisamente naquele momento, ouve um grito do outro lado da sala: NÃO! NÃO TOQUES NISSO!

Assustada, a criança cai para trás sobre as nádegas e começa a chorar. Obviamente, isto é uma ocorrência muito comum e completamente inevitável. As crianças não fazem a mínima ideia de que se podem magoar ou como a jarra pode ser valiosa. De facto, saber o que é seguro ou não e qual o valor das coisas são importantes lições que a criança tem de aprender. No entanto, há algumas dinâmicas psicológicas extremamente importantes que devem ser aqui ativadas e que têm um efeito direto na nossa capacidade de criar o tipo de disciplina e ênfase necessários para fazer trading eficazmente mais tarde.

O que acontece quando nos negam a oportunidade de nos exprimirmos da forma que queremos ou quando somos forçados a exprimirmo-nos de uma forma que não está de acordo com o nosso processo natural de seleção? A experiência cria uma perturbação. Estar perturbado sugere um desequilíbrio. Mas exatamente o que é que está desequilibrado? Para que alguma coisa esteja desequilibrada, tem de haver em primeiro lugar algum elemento equilibrado ou de proporções equivalentes. Esse elemento é o grau relativo de correspondência que existe entre o nosso ambiente interior, mental, e o ambiente exterior onde vivemos as nossas vidas.

Por outras palavras, as nossas necessidades e desejos são gerados no nosso ambiente mental e são satisfeitos no ambiente exterior. Se estes dois ambientes tiverem correspondência entre si, estamos num estado de equilíbrio interior e sentimos uma sensação de satisfação ou felicidade. Se estes ambientes não estiverem em harmonia, sentimos descontentamento, cólera e frustração ou aquilo a que normalmente se chama dor emocional.

Mas por que é que ao não obtermos aquilo que desejamos ou ao nos ser negada a liberdade de nos exprimirmos como queremos, sentimos dor emocional? A minha teoria pessoal é que as necessidades e os desejos criam vácuos mentais. O universo em que vivemos tem uma tendência natural para não tolerar o vácuo e age para o preencher imediatamente. (O filósofo Espinoza disse há séculos que a natureza abomina o vácuo.)

Experimente aspirar totalmente o ar de uma garrafa e verá que a sua língua e lábios ficarão colados à boca da garrafa, porque criou um desequilíbrio (um vácuo) que tem agora de ser preenchido. Qual é a dinâmica por detrás da expressão “a necessidade é a mãe de todas as invenções”? O reconhecimento de que uma necessidade cria um vácuo mental que o universo irá preencher com pensamentos inspiradores (se a sua mente for receptiva). Os pensamentos, por sua vez, inspiram movimento e ação dos quais resultará a satisfação daquela necessidade.

A este respeito, penso que o nosso ambiente mental funciona em grande medida como o universo. Quando reconhecemos uma necessidade ou desejo, agimos para preencher o vácuo com uma experiência do meio exterior que os satisfaça. Se nos negam a oportunidade de ir atrás do objeto dessa necessidade ou desejo, parece literalmente que nos falta alguma coisa, o que nos coloca num estado de desequilíbrio ou dor emocional. Será que as nossas mentes também abominam um vácuo quando se deparam com um?

Tire um brinquedo a uma criança (independentemente das razões para o fazer) e a reação será uma dor emocional. Com 18 anos, já teremos ouvido vários milhares de recusas até atingirmos a idade adulta. Chamo a este tipo de experiências impulsos de aprendizagem recusados – impulsos que são oriundos de uma necessidade interior; que têm origem na parte mais profunda da nossa identidade, no nosso processo de seleção natural.

O que acontece a todos estes impulsos que foram recusados e deixados por satisfazer? Será que simplesmente desaparecem? Pode ser, se forem de algum modo apaziguados: se nós ou alguém fizer alguma coisa que coloque novamente o nosso ambiente mental em equilíbrio. E o que é capaz de colocar o nosso ambiente mental de novo em equilíbrio? Há algumas técnicas. A mais natural, especialmente para uma criança, é simplesmente chorar.

O choro é um mecanismo natural para apaziguar estes impulsos recusados e não satisfeitos. Os investigadores científicos descobriram que as lágrimas são compostas por iões com carga negativa. Assim, seguindo o seu curso natural, o choro irá expelir a energia com carga negativa das nossas mentes e leva-nos de novo a um estado de equilíbrio, muito embora o impulso original nunca tenha sido satisfeito.

O problema é que na maior parte das vezes, não deixamos que os acontecimentos sigam o seu curso natural e os impulsos recusados nunca são compensados (pelo menos enquanto ainda somos crianças). Há muitas razões por que os adultos não gostam que os seus filhos (especialmente os rapazes) chorem e fazem tudo o que podem para desencorajar este comportamento. Há uma igual quantidade de razões por que os adultos não explicam às crianças por que são obrigadas a fazer alguma coisa que não querem. Mesmo que os adultos tentem, não há garantias de que sejam suficientes para compensar o desequilíbrio. O que acontece se estes impulsos não forem compensados?

Acumulam-se e normalmente acabam por se manifestar em um sem-número de padrões de comportamento aditivo e compulsivo. Um princípio empírico muito genérico é: o que acreditamos ter-nos sido recusado em criança, pode facilmente tornar-se numa dependência na idade adulta. Por exemplo, muitas pessoas são dependentes de atenção. Refiro-me a pessoas que farão tudo para chamar a atenção sobre si mesmas. A razão mais comum para este comportamento é que acreditam que não receberam atenção suficiente quando eram novas ou então que não a tiveram numa fase importante da sua vida. Em qualquer caso, a privação transforma-se em energia emocional não resolvida que conduz a comportamentos que visam a satisfação dessa dependência. O que é importante percebermos sobre estes impulsos recusados e não apaziguados (que existem em todos nós) é o modo como afetam a nossa capacidade de nos concentrarmos e abordarmos de uma forma disciplinada e consistente.

As salvaguardas

Para operar de forma eficaz num ambiente de trading, são precisas regras e limites que orientem o nosso comportamento. É um dado adquirido que existe o risco de causarmos danos avultados a nós próprios – danos que podem ir bastante além do limite do que pensamos possível ou aceitável. Há alguns tipos de trade sem que o risco deperda é ilimitado. Para prevenir a possibilidade de nos expormos a esse ou outro tipo de danos, precisamos de criar uma estrutura interna sob a forma de disciplina mental especializada e uma abordagem que oriente o nosso comportamento no sentido que queremos. Esta estrutura tem que existir dentro de cada um de nós, porque ao contrário da sociedade, o mercado não a fornece.

Os mercados fornecem uma estrutura sob a forma de padrões comportamentais que indicam quando existe uma oportunidade de comprar ou vender. Mas é aqui que termina a estrutura – com essa simples indicação. Por outro lado, da perspectiva do indivíduo, não há regras formalizadas para orientar o comportamento. Nem sequer há os conceitos de princípio, meio e fim como há em praticamente todas as outras atividades em que participamos.

Esta é uma distinção extremamente importante com profundas implicações psicológicas. O mercado é como um fluxo em constante movimento. Não arranca, não para e nem espera. Mesmo quando os mercados estão fechados, os preços mantêm-se em movimento. Não há regra que diga que o preço de abertura num determinado dia tenha que ser o mesmo do preço do fecho do dia anterior. Nada do que fazemos nas outras dimensões das nossas vidas em sociedade, consegue preparar-nos para agirmos eficazmente num ambiente tão sem limites.

Mesmo os jogos de sorte têm estruturas intrínsecas que os tornam muito diferentes do trading e muito menos perigosos. Por exemplo, se decidirmos jogar blackjack, a primeira coisa que temos de fazer é decidir quanto vamos apostar ou arriscar. Isto é uma escolha que fazemos, forçados pelas regras do jogo. Se não o fizermos, não jogamos.

No trading, ninguém nos vai obrigar a definir previamente qual o nível de risco que assumimos, exceto nós próprios. De facto, o que temos é um ambiente sem limites, onde praticamente tudo pode acontecer, em qualquer momento e onde só os ganhadores consistentes definem o seu risco antes de abrirem uma nova posição. Para todos os outros, definir o risco antecipadamente iria obrigá-los a enfrentar a realidade de que cada trade tem um resultado incerto e que esse resultado pode ser perder. Os perdedores persistentes fazem tudo o que podem para não aceitarem a realidade de que, independentemente do quão bom um trade pareça, este pode fracassar. Sem a presença de uma estrutura externa a forçá-los a pensar de outra forma, entregam-se a um sem-número de justificações, racionalizações e a todo o tipo de lógicas distorcidas que os farão entrar em trades acreditando que não podem perder, o que torna irrelevante a determinação prévia do nível de risco que querem assumir.

Todos os jogos de sorte têm princípios, meios e fins especificados com base numa sequência de acontecimentos que determinam o resultado do jogo. Quando alguém decide participar, não pode mudar de ideias – tem que participar enquanto durar. Isto não se aplica ao trading. No trading, os preços estão em constante movimento, nada começa até o trader decidir, dura o tempo que o trader quiser e não acaba até o trader querer. Independentemente do que possa ter planeado ou intencionado fazer, um sem-número de fatores psicológicos podem entrar em jogo, fazendo com que o participante se distraia, mude de ideias, fique assustado ou com excesso de confiança: por outras palavras, fazendo com que o trader se comporte de modo errático e involuntário.

Como os jogos de sorte têm um final pré-definido, obrigam o participante a ser um perdedor ativo. Se estiver num período de perdas, não pode continuar a perder sem tomar uma decisão consciente de o fazer. O final de cada jogo conduz ao início de um novo jogo e o jogador pode decidir sujeitar mais alguns dos seus bens a mais risco abrindo a sua carteira ou empurrando algumas fichas para o centro da mesa.

O trading não tem um final pré-definido. O mercado não o vai fazer sair de um trade. A menos que tenha a estrutura mental adequada para terminar um trade no momento em que quiser, facilmente pode transformar-se num perdedor passivo. Isto significa que quando estiver a perder num trade, não tem que fazer nada para continuar a perder. Nem sequer tem que observar. Pode simplesmente ignorar e o mercado irá tirar-lhe tudo o que possui e, possivelmente, mais ainda.

Uma das muitas contradições do trading é que este oferece um presente envenenado. O presente é que, talvez pela primeira vez nas nossas vidas, controlamos completamente tudo o que fazemos. O veneno é que não há regras ou limites para orientar ou estruturar o nosso comportamento. A estrutura de que precisamos para orientar o nosso comportamento tem de ter origem na nossa mente, como um ato consciente e de livre vontade. É aqui que começam muitos problemas.

Problema: Relutância em criar regras

Ainda não encontrei um trader que não oferecesse resistência à ideia de criar um conjunto de regras. Essa resistência nem sempre é explícita. Muito pelo contrário, é normalmente subtil. Por um lado, concorda que as regras fazem todo o sentido, mas na realidade não tem a mínima intenção de as aplicar. Esta resistência pode ser muito forte e tem uma origem lógica.

A nossa mente está estruturada em resultado da nossa educação social e das escolhas que outras pessoas fizeram por nós e incutiram nas nossas mentes. Este é um dado muito importante. Durante o processo de incutir uma estrutura, muitos dos nossos impulsos para agir, expressar e aprender através das nossas próprias experiências foram rejeitados. Muitos destes impulsos nunca foram compensados e ainda existem dentro de nós sob a forma de frustração, raiva, desilusão, culpa ou ódio. A acumulação destes sentimentos negativos funciona como uma força dentro do nosso ambiente mental que nos faz resistir a tudo que nos negue a liberdade de fazer e ser aquilo que queremos quando queremos.

Por outras palavras, a primeira razão que nos faz sentir atraídos para o trading – a liberdade ilimitada para a expressão criativa – é a mesma razão por que sentimos uma resistência natural à criação de regras e limites para orientar o nosso comportamento. É como se tivéssemos encontrado um estado utópico em que houvesse total liberdade e depois alguém nos batesse no ombro e dissesse: “Hei, tens que criar regras e ter disciplina para desfrutares dela”.

A necessidade de regras pode fazer todo o sentido, mas é difícil termos a motivação para as criar quando andamos a maior parte das nossas vidas a fugir delas. Normalmente é preciso uma boa dose de emoções negativas para derrubar a fonte da nossa resistência e definir e cumprir um regime de trading organizado, consistente e que reflita orientações de gestão de dinheiro prudentes. Não estou a sugerir que tenha de apaziguar todas as suas frustrações e desilusões do passado para se transformar num trader de sucesso, porque não é o caso. E certamente não tem de sofrer. Eu trabalhei com muitos traders que alcançaram os seus objetivos de ganhos consistentes e não fizeram nada para apaziguar a sua reserva de impulsos negados. No entanto, sugiro que não tome como suficiente à partida o esforço e ênfase que coloca na construção do tipo de estrutura mental que pensa que lhe irá compensar o efeito negativo que os impulsos negados têm nas competências para ser um trader de sucesso.

Problema: Não assumir responsabilidade

O trading é caracterizado por ser uma escolha pessoal pura e livre com um resultado incerto. Recorde-se que nada acontece até nos decidirmos começar; dura o tempo que quisermos e não acaba até que decidamos parar. Todos estes princípios, meios e fins são o resultado da interpretação que fazemos da informação disponível e do modo como escolhemos agir com base nessa interpretação. Ora, queremos a liberdade para fazer escolhas, mas isso não significa que estejamos automaticamente predispostos a aceitar a responsabilidade pelos resultados. Os traders que não estão dispostos a aceitar responsabilidade pelos resultados das suas interpretações do mercado e dos seus atos irão confrontar-se com um dilema. Como é que alguém participa numa atividade que permite uma completa liberdade de escolha e ao mesmo tempo evita responsabilizar-se se o resultado das suas escolhas for inesperado ou não estiver de acordo com a sua expectativa?

A dura realidade do trading é que, se queremos criar consistência, temos que iniciar da premissa que, seja qual for o resultado obtido, somos inteiramente responsáveis por esse resultado. Este é um nível de responsabilidade a que poucas pessoas estão dispostas a assumir antes de decidirem tornarem-se traders. A forma de evitar responsabilidade é adotar um estilo de trading que é, para todos os efeitos, aleatório. Defino trading aleatório como trades mal planeados ou não planeados de todo. É uma abordagem não organizada que considera um conjunto ilimitado de variáveis de mercado, o que não permite descobrir o que funciona ou não numa base consistente.

A aleatoriedade é liberdade não estruturada sem responsabilidade. Quando fazemos trading com pouco planeamento e com um conjunto ilimitado de variáveis, torna-se fácil chamar a nós o crédito pelos trades bem-sucedidos (porque esteve presente algum método). Ao mesmo tempo, é fácil não assumir responsabilidade pelos trades que não resultaram (porque há sempre alguma variável que não conhecíamos e, por conseguinte, não a podíamos ter levado em consideração).

Se o comportamento do mercado fosse efetivamente aleatório, seria difícil, se não impossível, criar consistência. Se é impossível ser consistente, então não temos que assumir qualquer responsabilidade. O problema com esta lógica é que a nossa experiência direta dos mercados nos diz algo diferente.

O mesmo tipo de padrões de comportamento surgem repetidamente. Muito embora o resultado de cada padrão individual seja aleatório, o resultado de uma série de padrões é consistente (estatisticamente fiável). Isto é um paradoxo que é facilmente resolvido com uma abordagem disciplinada, organizada e consistente.

Trabalhei com inúmeros traders que passavam horas a fazer análises de mercado e a planear trades para o dia seguinte. Depois, em vez de realizarem os trades que tinham planeado, faziam outra coisa. Os trades que eles realizavam eram normalmente ideias de amigos ou dicas de corretores. Não é preciso dizer que os trades que originariamente planearam, mas não executaram, eram normalmente os grandes ganhadores do dia. Este é um exemplo clássico de como nos tornamos suscetíveis ao trading aleatório e não estruturado, porque queremos evitar responsabilidade.

Quando agimos de acordo com as nossas ideias, colocamos as nossas capacidades numa posição vulnerável e obtemos um feedback imediato sobre o modo como as nossas ideias funcionaram. É muito difícil justificar resultados insatisfatórios. Por outro lado, quando entramos num trade aleatório e não planeado, é muito mais fácil transferir a responsabilidade para terceiros, culpando o amigo ou o corretor pelas más opções.

Há algo mais acerca da natureza do trading que facilita a fuga à responsabilidade e que resulta da criação de uma estrutura favorável ao trading aleatório: é o facto de qualquer trade ter o potencial de ser bem-sucedido, muito bem-sucedido. Este grande tropeço pode acontecer a qualquer um, a um grande analista ou a um analista de menor qualidade; quer assuma ou não a responsabilidade. Dá trabalho criar uma abordagem disciplinada necessária para se ser um trader sustentadamente ganhador. Mas, como vimos, é muito fácil ceder ao trading aleatório e não disciplinado.

Problema: Dependência de recompensas aleatórias

Foram realizados diversos estudos em macacos acerca dos efeitos psicológicos de recompensas aleatórias. Por exemplo, se ensinarmos um macaco a realizar uma tarefa e o recompensarmos cada vez que a faz, o macaco aprende rapidamente a associar os esforços à um resultado específico. Se deixamos de o recompensar, rapidamente o macaco deixará de realizar a tarefa. Não irá desperdiçar a sua energia a fazer uma coisa pela qual agora sabe que não irá receber qualquer recompensa.

No entanto, a reação do macaco à retirada da recompensa é muito diferente se iniciarmos a tarefa em horários aleatórios, em vez de sempre à mesma hora. Quando paramos de oferecer a recompensa, não há forma de o macaco saber se será ou não recompensado. Sempre que foi recompensado anteriormente, esta surgiu como uma surpresa. Em resultado disso, da perspetiva do macaco, não há nenhuma razão para desistir de fazer a tarefa. O macaco continua a fazer a tarefa, mesmo sem ser recompensado. Alguns irão continuar indefinidamente.

Não tenho a certeza por que razão nos tornamos dependentes de recompensas aleatórias. Se tivesse que adivinhar, diria que provavelmente tem algo a ver com químicos indutores de euforia que são libertados no nosso cérebro quando experimentamos uma surpresa agradável e inesperada. Se uma recompensa for aleatória, nunca temos a certeza se e quando a vamos receber, pelo que não é difícil despender energia e recursos na esperança de experimentar novamente aquela maravilhosa sensação de surpresa. De facto, para muitas pessoas pode ser viciante. Por outro lado, quando esperamos um resultado particular e ele não acontece, ficamos desiludidos e sentimo-nos frustrados. Se o fizermos de novo e obtivermos o mesmo resultado decepcionante, é provável que não continuemos a realizar uma tarefa que sabemos que nos irá causar sofrimento emocional.

O problema com qualquer dependência é que ela nos deixa num estado de sem escolha. Seja qual for o grau de domínio dessa dependência sobre o nosso estado mental, será o mesmo grau em que nos focamos e esforçamos para satisfazer a nossa dependência. E fazemo-lo ignorando ou rejeitando a satisfação de outras necessidades (como confiarmos em nós próprios ou protegermos os nossos bens de um risco demasiado elevado). Sentimo-nos impotentes para agir noutra direção que não seja satisfazer a dependência. Uma dependência de recompensas aleatórias é particularmente problemática para os traders porque é uma outra fonte de resistência à criação da estrutura mental que conduz aos ganhos consistentes.

Problema: Controle externo vs. controle interno

A nossa educação programou-nos para funcionar em sociedade, o que significa que adquirimos determinadas estratégias de pensamento para satisfazer as nossas necessidades, vontades e desejos orientados para a interação social. Não só aprendemos a depender uns dos outros para satisfazer as necessidades, vontades e desejos que não conseguimos satisfazer sozinhos, mas ao longo do processo adquirimos também muitas técnicas de controlo e manipulação social para assegurar que outras pessoas se comportam de forma a estarem em consonância com aquilo que queremos.

Os mercados aparentemente têm características sociais, por envolverem tantas pessoas, mas não o têm de facto. Se, na sociedade moderna de hoje, aprendemos a depender uns dos outros para satisfazer as nossas necessidades básicas, o ambiente do mercado (muito embora exista dentro da sociedade moderna) pode ser caracterizado como uma turbulência psicológica, onde é verdadeiramente cada um por si. Não só não podemos ficar à espera que o mercado faça qualquer coisa por nós, como é extremamente difícil, se não impossível, manipular ou controlar o mercado. Ora, se nos tornámos eficazes a satisfazer as nossas necessidades, vontades ou desejos aprendendo a controlar e a manipular o ambiente a nosso favor, mas subitamente nos encontramos, como traders, num ambiente que não sabe, não lhe interessa e não responde aos nossos estímulos, onde ficamos então? Se respondeu: “perdidos!”, acertou.

Uma das principais razões por que tantas pessoas de sucesso fracassam no trading é que o seu sucesso é, em parte, o resultado da sua capacidade superior de manipular e controlar o ambiente à sua volta. Em alguma medida, todos nós aprendemos ou desenvolvemos técnicas para acomodar o ambiente externo ao nosso ambiente mental (interior). O problema é que nenhuma destas técnicas funciona com o mercado. O mercado não responde ao controlo e à manipulação (a menos que sejamos traders de grande dimensão). No entanto, podemos controlar a percepção e a interpretação que fazemos das informações do mercado, bem como o nosso comportamento. Em vez de tentarmos controlar o que nos rodeia, podemos aprender a controlar-nos a nós mesmos. Assim, podemos entender a informação o mais objetivamente possível e estruturar o nosso ambiente mental para se acomodar ao mercado e agirmos em nosso benefício.


Conclusão

O Capítulo 2 do livro “Trading in The Zone” de Mark Douglas aborda um conceito fundamental no mundo do trading: a aleatoriedade dos mercados financeiros. Douglas destaca a importância de os traders compreenderem que, embora haja padrões e tendências nos mercados, a cada momento, o próximo movimento do mercado é, em última instância, imprevisível. Isso significa que não importa quão experiente um trader seja, sempre haverá um elemento de incerteza envolvido.

A conclusão deste capítulo nos lembra que, para ter sucesso como trader, é crucial aceitar essa aleatoriedade e estar preparado para enfrentá-la com uma mentalidade disciplinada e resiliente. Os traders devem aprender a controlar suas emoções, seguir suas estratégias de negociação com disciplina e adotar uma abordagem objetiva diante das perdas e ganhos. Ao fazê-lo, eles estarão melhor equipados para lidar com a volatilidade do mercado e manter uma perspectiva de longo prazo, essencial para alcançar o sucesso consistente no trading.

Em resumo, o Capítulo 2 de “Trading in The Zone” nos ensina que, embora os mercados financeiros possam ser imprevisíveis e caóticos, os traders podem prosperar adotando uma mentalidade adequada e controlando suas ações e reações emocionais. A aceitação da aleatoriedade dos mercados é o primeiro passo para se tornar um trader bem-sucedido, e é um tema que continuará a ser explorado ao longo do livro.


A Obra de Mark Douglas

Mark Douglas é amplamente reconhecido no mundo do trading por seus insights sobre a psicologia dos traders e por seus ensinamentos sobre como abordar o mercado com uma mentalidade disciplinada e orientada ao sucesso. Ao longo de sua carreira, Douglas publicou diversos livros que se tornaram leituras essenciais para traders de todos os níveis de experiência. Aqui está uma lista dos seus livros mais influentes, juntamente com breves resumos:

               
  1. “Trading in the Zone: Master the Market with Confidence, Discipline and a Winning Attitude” (Negociando na Zona)
    • Resumo: Este é talvez o livro mais popular de Douglas. Ele aborda os principais obstáculos psicológicos enfrentados por traders e fornece soluções para superá-los. Douglas destaca a importância de desenvolver uma mentalidade disciplinada e focada em probabilidades, ao invés de se concentrar em ganhos ou perdas individuais.
  2. “The Disciplined Trader: Developing Winning Attitudes” (O Trader Disciplinado)
    • Resumo: Neste livro, Douglas explora a psicologia do trader e a necessidade de desenvolver atitudes vencedoras para ter sucesso nos mercados. Ele aborda as emoções comuns que podem sabotar um trader e oferece estratégias para gerenciar e superar esses desafios mentais.
  3. “The Little Book of Trading Performance”
    • Resumo: Um guia mais curto e conciso, este livro destila a sabedoria de Douglas em dicas práticas e insights sobre o desempenho no trading. Ele oferece conselhos sobre como manter a consistência, superar obstáculos psicológicos e otimizar o desempenho geral.

Os livros de Mark Douglas são uma fonte inestimável de sabedoria para qualquer trader que deseja melhorar sua abordagem mental ao trading. Eles oferecem não apenas técnicas e estratégias, mas também uma compreensão profunda da natureza humana e de como superar os desafios internos que todos os traders enfrentam.


Sempre é Importante Lembrar

Operar no mercado financeiro não se resume a análises e previsões. É primordial possuir um controle emocional robusto ao realizar suas operações. A gestão de risco é um elemento vital, pois envolve escolher o tamanho apropriado para as posições, determinar pontos de stop loss e estipular metas lucrativas. Nunca esqueça da volatilidade intrínseca aos mercados e que enfrentar perdas é parte integrante da trajetória do trader. Esteja sempre aberto a novos métodos, realinhe estratégias quando necessário e busque atualização constante. Com foco, disciplina e resiliência, você potencializará suas chances de se destacar como um trader lucrativo.


A Melhor Forma de Aprender Sobre Trading

Uma das melhores maneiras de aprofundar seus conhecimentos sobre trading é, sem dúvida, através da leitura de livros especializados no assunto. Os insights e experiências compartilhadas por autores renomados podem ser fundamentais para o seu desenvolvimento. E, além dos livros, aproveite os recursos oferecidos pelo canal “Com Lucro”, que disponibiliza informações valiosas, vídeos e aulas voltadas para traders de todos os níveis.


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